domingo, 6 de setembro de 2009

Divagações de um dia - Sábado 22/8/09


Às vezes tenho tantas impressões interessantes em um único dia, que sinto vontade de colocar todas por escrito diariamente.
Hoje, por exemplo, acordei incrivelmente feliz. Mas não havia nenhum motivo especial, quer dizer, além daqueles pelos quais já devemos automaticamente nos alegrar todo dia. Acordei com uma enorme, contagiante e verdadeira sensação de que alguma coisa muito boa iria acontecer a qualquer momento. Era o tão conhecido sentimento de ansiedade que nos toma em vésperas de viagens ou de acontecimentos extraordinários. Mas hoje não havia absolutamente nada de especial. Um sábado comum de aulas. Isso, porém, não impediu que a sensação se estendesse por toda a manhã. Foi uma manhã plenamente feliz, muito mais feliz que o normal.
Acordei com esse sentimento e com uma vontade gigantesca de fazer algo de bom. Mas o máximo que consegui foi sorrir um pouco mais para as pessoas que passavam, ou dar "bom dia" com um pouco mais de entusiasmo. Passei uns instantes tentando entender de onde aquela euforia repentina vinha, qual seria a origem dela, mas não havia mesmo nada de incrível a esperar do dia que vinha pela frente. Foi um sentimento bom, que veio assim, do nada.
Mas logo depois descobri que o dia estava nublado. Essa era a resposta. Estava nublado, com cara de chuva. E a chuva tem algum poder oculto sobre mim, isso é fato. Algum poder mágico, sobrenatural não sei. Só sei que ela me afeta ao extremo. Me deixa muito, muito feliz mesmo; inunda as ruas e, junto, me inunda de paz e felicidade verdadeira. Me faz querer agir, mudar, ser uma pessoa melhor, me transformar. Lava o mundo e lava minha alma de tudo que ela poderia ter de ruim. É. A chuva certamente tem algum poder sobre mim.
Quando era menor e começava a chover uma chuva das boas, com ventos e friozinho de arrepiar, eu tinha vontade de ir para o terraço, sentar no chão e ficar lá, só olhando; olhando e sentindo. Vendo o mundo ficar meio embaçado, a água caindo em bicas das bordas dos telhados. Mas mamãe não deixava; ela contou a história de um homem que morrera no terraço de sua casa, durante uma chuva torrencial. Um raio caira pelas redondezas e, como ele estava no terraço, morreu. Então, proibida de fazer a minha vontade, eu ia para a sala, sentava no sofá e deixava a janela aberta. Não me importava que o chão ficasse molhado, porque enxugá-lo depois não era mesmo um problema. O importante era que eu visse aquilo. Assim eu passava algum tempo como que hipnotizada por aquele fenômeno que me fazia sentir tão confortável.
Depois dessas constatações, fui à escola. Cheguei então àquele lugar em que me sinto tão bem e percebi que continuava tão feliz quanto me encontrava desde que acordara. Ao chegar à área próxima à praça de eventos, deparei-me com a turma da 3ª série preperando-se para ir à Porciúncula. Ah, Porciúncula; que lugar incrivelmente maravilhoso. Para mim, a verdadeira concretização da paz; o lugar onde nos sentimos mais próximos do Tio Marcílio. O que não esperava, porém, ao ver aquela aglomeração de crianças com a ansiedade no rosto, era que alguém ali me avistaria. Mas foi o que aconteceu. Ela acenou para mim, com um sorriso no rosto. Estava sentada no chão, mas se levantou e correu para me abraçar ainda sorrindo muito. Eu perguntei, apesar de já saber a resposta: "Vocês vão para a Porciúncula, né?" Ela: "É!" Eu de novo: "Que inveja!!!" Ela achou graça.
Para mim, o gesto de carinho dela foi algo extremamente lindo. Se eu já estava feliz, depois daquilo fiquei completamente em paz, e em sentimento de realização me encheu. Crianças são mesmo seres singulares. A sinceridade do sorriso delas pode fazer qualquer um ganhar o dia. Vale ressaltar, que é estranho falar assim de "crianças", considerando que ano passado ainda ganhei presente no dia 12 de outubro e que talvez esse ano dê um jeito de ganhar também. Mas o fato é que depois de ler aquele livro A Cabana, me sinto especialmente tocada por crianças. A relação entre pais e filhos agora chega a emocionar de um jeito, que é estranho até mesmo para mim. É algo extraordinariamente sublime.
Enfim, quanto ao resto do dia, permitiu que eu chegasse a duas conclusões às quais eu já havia chegado antes. Primeiro, eu odeio frio; segundo, é exatamente por isso que eu amo a minha cidade e que não pretendo morar nunca em outro lugar. O processo que levou até essas constatações foi passar 4 horas e meia em um auditório semplesmente congelante, fazendo a prova da Olimpíada Brasileira de Química.
Foi um dia especial. Permeado de divagações e sentimentos especiais. O fato é que, no final das contas, ele foi muito importante mesmo para mim, e por isso sou eternamente grata por tê-lo vivido.
OBS: No texto há alguns problemas de colocação pronominal, mas eu resolvi deixar assim mesmo, visto que fica mais próximo da informalidade. =]

sábado, 5 de setembro de 2009

Pensamentos sobre o pensamento


Pensar demais causa perturbações.
O Ministério da Saúde ainda não advertiu sobre tal fato, mas apesar do que possa parecer, é uma conclusão realmente interessante a se chegar.
O ócio, a falta do que fazer mesmo, pode levar um indivíduo a passar horas a contemplar um teto: pensando; e só. O resultado disso pode ser um certo embaralhamento incômodo de ideias, que pode, por sua vez, levar à loucura momentânea, ou, quem sabe, a alguma frase incomum que possa dar início a um texto. :)
Mas pensar assim demais, sem parar, por muito tempo, pode acarretar principalmente determinadas perturbações de espírito e algum cansaço mental. Especialmente quando se consegue sentir o imaginado de maneira quase real. Nesse caso, todos os diálogos, situações e possibilidades criados são, de certa forma, vividos. E então você se surpreende formulando um discurso reacionário altamente revoltado e quando percebe, está de punhos fechados, com o pulso acelerado e andando imperceptivelmente pela casa.
Contudo, pensar é mesmo bom. Serve para rever as convicções, analisar acontecimentos, formular críticas. Às vezes, o amor fica guardado em pensamento. O ato de pensar é, por si só, sincero. Isso porque geralmente pensamos em silêncio e "não há nada mais sincero que o silêncio"¹. O pensamento é algo verdadeiro porque ao voltarmos o olhar para dentro de nós mesmos, enxergamo-nos completamente despidos, seres enquanto essências, sem véus ou disfarces. E por mais que tentemos, nada pode ser ocultado. Não podemos nos esconder ao pensamento. Somos constituídos por um conjunto de experiências acumuladas dia após dia, e fazemos parte de uma teia de relações. Cada relação também faz parte dos indivíduos nela envolvidos. E nenhuma percepção ou vivência escapa ao pensamento.
São justamente as diversas nuances de pensamento que determinam a variedade de caracteres existentes. Isso demonstra claramente a influência absoluta do pensamento sobre os próprios indivíduos pensantes. Que elemento tão poderoso é esse capaz de instigar atitudes, alimentar consciências, armazenar sentimentos? Algo é certo: é aquilo que move a humanidade e que mantém o mundo a girar.

1: Fernando Sabino em O Encontro Marcado.

sábado, 23 de maio de 2009

A festa da hipocrisia

Depois da música super mala power do Legião Urbana, que apesar de tudo, traz um final esperançoso e otimista, vem a crônica: =)


Hoje de manhã cheguei a uma conclusão definitiva acerca de um assunto sobre o qual tinha quase certeza: a profissão de professor é uma das mais difíceis que existem. Esses seres humanos que seguem tal caminho têm simplesmente que “aprender” a lidar com os mais diversos e infinitos tipos de pessoas. Vi uma mãe louca e relativamente histérica passar 15 minutos “conversando” com um professor. Vale ressaltar que, na verdade, a meu ver, ela estava realmente gritando. No começo, senti uma raiva instantânea daquela pessoa alterada, mas não porque eu quisesse estudar e ela simplesmente não permitisse devido à altura com que “falava”, e sim porque uma das coisas que não consigo suportar é ver pessoas gritando com professores. Definitivamente não entra na minha cabeça como alguém pode chegar ao cúmulo de berrar, sem mais nem menos, com criaturas tão maravilhosas e admiráveis como são os verdadeiros mestres. É muita falta de noção para o meu gosto. E o pior é que isso, infelizmente, não deve ser raro.
Também pude perceber outro fato talvez até mais relevante que o primeiro. Apesar da raiva, não consegui deixar de rir quando ouvi a louca berrar de maneira um tanto assustadora: “Professor!! Tudo o que meu filho sofre! A dor...!” (a entonação dada a essa última palavra foi especialmente cômica). Inevitável não sorrir. A dor?!?! Foi um pouco demais para mim. Essa frase soou tão inacreditável quanto absurda; ridícula e, por isso mesmo, engraçada.
Meu Deus! O filho dela está sofrendo! E pelo modo como fala, está sofrendo muito!
Realmente... Há pessoas morrendo de fome e sede por todos os lados, há inocentes sendo cruelmente assassinados a cada instante, há miseráveis que dariam tudo para simplesmente terem a oportunidade de comer, há pessoas desabrigadas, sem família, sem nada! Quantas não sonham em viver a “dor” de estudar, comer e dormir, apenas?! Mas é lógico que quem está sofrendo é o filho daquela mulher! Ele está sentindo dores! Ficando até doente com frequência, quem sabe!! É mesmo um horror... Estresse crônico ou psicológico é doença séria, não é verdade?!
Coitados... Talvez se soubessem mesmo o que é sofrer, fossem pessoas um pouco melhores.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Perfeição - Legião Urbana


Vamos celebrar a estupidez humana
A estupidez de todas as nações
O meu país e sua corja de assassinos
Covardes, estupradores e ladrões
Vamos celebrar a estupidez do povo
Nossa polícia e televisão
Vamos celebrar nosso governo
E nosso Estado, que não é nação
Celebrar a juventude sem escolas
As crianças mortas
Celebrar nossa desunião
Vamos celebrar Eros e Thanatos
Persephone e Hades
Vamos celebrar nossa tristeza
Vamos celebrar nossa vaidade
Vamos comemorar como idiotas
A cada fevereiro e feriado
Todos os mortos nas estradas
Os mortos por falta de hospitais
Vamos celebrar nossa justiça
A ganância e a difamação
Vamos celebrar os preconceitos
O voto dos analfabetos
Comemorar a água podre
E todos os impostos
Queimadas, mentiras e sequestros
Nosso castelo de cartas marcadas
O trabalho escravo
Nosso pequeno universo
Toda a hipocrisia e toda a afetação
Todo roubo e toda a indiferença
Vamos celebrar epidemias:
É a festa da torcida campeã
Vamos celebrar a fome
Não ter a quem ouvir
Não se ter a quem amar
Vamos alimentar o que é maldade
Vamos machucar um coração
Vamos celebrar nossa bandeira
Nosso passado de absurdos gloriosos
Tudo que é gratuito e feio
Tudo o que é normal
Vamos cantar juntos o Hino Nacional
A lágrima é verdadeira
Vamos celebrar nossa saudade
E comemorar a nossa solidão
Vamos festejar a inveja
A intolerância e a incompreensão
Vamos festejar a violência
E esquecer da nossa gente
Que trabalhou honestamente a vida inteira
E agora não tem mais direito a nada
Vamos celebrar a aberração
De toda a nossa falta de bom senso
Nosso descaso por educação
Vamos celebrar o horror
De tudo isso
- Com festa, velório e caixão
Está tudo morto e enterrado agora
Já que também podemos celebrar
A estupidez de quem cantou esta canção
Venha, meu coração esta com pressa
Quando a esperança está dispersa
Só a verdade me liberta
Chega de maldade e ilusão
Venha, o amor tem sempre a porta aberta
E vem chegando a primavera;
Nosso futuro recomeça:

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Por Bruna Dantas:


Afinal, o que é ser feliz?
Ser feliz é dar valor às pequenas coisas da vida, que são as mais importantes e que realmente marcam. É abraçar e ser o último a soltar os braços, é distribuir sorrisos a quem precisa, é gritar de felicidade só pelo simples prazer de existir.
Ser feliz é comemorar um gol do seu time amado, é dançar sem música, é ter perseverança para vencer obstáculos e também humildade após cada vitória. É ajudar alguém necessitado, é dar sem esperar receber; fazer boas ações sem planejar recompensas futuras.
Ser feliz é apaixonar-se e amar alguém do jeito que ele realmente é, com seus defeitos e qualidades. É ver beleza na simplicidade da vida e nos ensinamentos que ela nos transmite. É ter acessos de riso por motivos sem importância e viver cada segundo como se fosse o último, 'porque um dia ele realmente será'. E lembre sempre que 'a felicidade não está nos momentos em que respiramos tranquilamente, mas sim nos que nos deixam sem fôlego'.
Ser feliz é transmitir energia positiva às pessoas ao seu redor e, acima de tudo, ser feliz é amar. Pois não há ferida que o amor não sare, nem escuridão que o amor não ilumine; nem doença que o amor não cure, nem pecado que o amor não perdoe, nem choro que o amor não converta em riso.
Você já foi feliz hoje?

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Somente a atitude traz a esperança


Durante a aula de física, abriu-se a discussão. Quase que imediatamente, perguntas pipocaram irrefreáveis em minha cabeça.
O assunto era a universidade e seus professores "responsabilíssimos" e extremamente comprometidos com a aprendizagem de seus alunos; verdadeiros "exemplos" de assiduidade e de postura social.
Por que as pessoas são tão injustas?
Por que certos indivíduos acomodam-se em suas poltronas de injustiça e despreocupação e ignoram completamente o ensino verdadeiro?
Por que reinam o descompromisso e a esculhambação?
O que leva as pessoas a agirem assim? Qual a finalidade delas ao adotarem esse tipo de postura?
A enxurrada de questionamentos inundou-me num arroubo de indignação. Quase ninguém mais pensa na educação propriamente dita. Não se importam em ensinar, em exercer suas profissões de maneira digna, em tentar construir pessoas mais conscientes, em ajudar o povo e o país a crescer.
Isso desce rasgando pela minha garganta e sai muito penosamente da ponta da caneta, mas sei que mudar imediatamente o perfil atual do mundo não é possível, pois pessoas já corruptas detêm o poder global. A busca de uma solução para isso remete exatamente a uma reflexão sobre a base, sobre a educação primária dada às crianças. Se nessas fossem inculcados os valores corretos, uma boa dose de consciência moral e social e, principalmente, um poder crítico aguçado, tudo poderia mudar. Infelizmente, porém, o “sonho” da educação adequada soa como uma utopia. Afinal, para que isso se concretizasse, seria antes necessário que os detentores do poder resolvessem mudar. Decidissem que a imoralidade e a falta de caráter é algo ruim e passassem a enxergar que no mundo também existem outras pessoas além deles mesmos. Mais difícil ainda: seria necessário que eles percebessem que o mundo [que pena!] não é propriedade particular deles.
Isto é, como oferecer um ensino de qualidade para os pequenos, se os mais capacitados para isso e os poderosos não estão nem aí? Conclui-se, portanto, que para que a realidade mudasse, seria necessário o surgimento de uma geração “cabeça-feita”, com senso crítico e consciência natos. Mas é aí que vem a outra alternativa. Os valores corretos de comprometimento social e solidariedade poderiam ser disseminados. Assim, uma geração inteira poderia ser reformulada e o mundo poderia, enfim, ser governado por pessoas boas.
É, infelizmente, isso também soa como uma utopia. Palavras bonitas, verbos no futuro do pretérito... Nada fácil. Mas como alguém sábio uma vez disse ao tentar "acalmar-me" de uma de minhas crises de revolta: “É muito mais fácil ser errado”. Essa é uma das maiores verdades que existem. Ter retidão moral é dificílimo. Principalmente quando todos ao redor mostram que o caminho mais fácil, mais cômodo, é o da desonestidade. Principalmente quando vê-se, por todos os lados, ladrões prosperarem com o dinheiro alheio e viverem felizes, sentados num trono feito da miséria do povo.
Contudo, o esforço valeria a pena. O nado contra a correnteza não seria em vão. Somente assim esperança.

Nas entrelinhas da Felicidade, quem sabe o que está escrito...

Agora um texto light, pra amenizar os dois que estão em cima e embaixo. =)

Descobri que a razão não me barra o sentimento.
Que o que vem de dentro simplesmente não tem seu grito abafado por certezas mundanas.
Que o espírito não descansa até poder gritar e vê-se livre dos arreios que a sociedade insiste em colocar.
Que a consciência deve ser tratada com esmero e atenção, pois é dela que vem a força para seguir contra a correnteza, é nela que está gravada a senha do cofre dos bons valores e é a partir dela que a alma vira pássaro e, sendo ave, voa rasante por novos mundos.
Descobri [já faz um tempo] que se deve alegrar com as pequenas coisas da vida, mas que, quando se encara a vida de maneira boa o suficiente para se viver assim, corre-se o risco de também entristecer pelos menores motivos. De qualquer forma, é um risco que vale a pena correr.
Descobri que nem sempre a paz é obtida por meio de grandes feitos ou de fórmulas pré-estabelecidas. Muitas pessoas sentem paz ao subirem numa árvore e ficarem a contemplar o céu azul; outras encontram paz na chuva, no cheiro bom que ela traz e nos seus ventos úmidos de transformação; há também aquelas que acham a paz em abraços: abraços de amigos, de professores, de tios, dos pais, de novos conhecidos... Aprendi que a paz está a toda volta, basta saber enxergá-la.
Descobri também que cada grão de areia da montanha faz a sua diferença, e que a união de partículas aparentemente insignificantes é capaz de mudar relevos inteiros. Para isso, basta ter paciência e saber usufruir dos agentes externos da melhor maneira possível.
Aprendi que se deve amar sem medo, sorrir sem arremedo [sorriso nunca é demais] e fazer valer a pena cada nova linha que se escreve na história do existir. Só assim o livro da vida poderá ter como título a "Felicidade".

terça-feira, 24 de março de 2009

Não importam as consequências, o bem deve sobreviver

Por que é tão difícil ser honesto? As pessoas têm se tornado disseminadoras e defensoras descaradas da corrupção. A barreira da incorruptibilidade quebrou-se. [Quase] todos estão agora imersos na desonestidade desmedida.
Queria acreditar que as pessoas não sabem ou não pensam mais no que estão fazendo, que elas simplesmente não analisam mais suas próprias ações. Mas isso seria iludir-me. O mundo ainda não está assim tão desprovido de consciência. Quer dizer, há consciência mais que suficiente para saber o que está errado, mas a cara de pau e a falta de outro tipo de consciência (mais crítica, mais humana) não permitem que esse ciclo vicioso de maldade tenha um fim.
Os caracteres são maleáveis como plástico. Moldáveis. A firmeza de espírito e de princípios deixou de existir. A população é manipulada e se deixa manipular por pessoas igualmente desonestas. No final, todos são farinha do mesmíssimo saco: tanto os que se deixam corromper, quanto os corruptores. A cara lavada e a falta de tudo que deveria existir numa pessoa correta, são características presentes em ambos os casos.
Parece que se perdeu a vergonha. Todos se tornaram verdadeiros “sem vergonha”, sem moral, sem o mínimo de qualquer coisa aproveitável. A decepção foi grande quando vi um amigo que admirava muito furando fila como tantos outros. “Mas não é algo tão [asquerosamente] normal?” Não o admiro mais.
Mas por que é tão difícil ser honesto? A honestidade está (ou deveria estar) incluída nos valores primordiais da humanidade. É algo básico, simples, que poderia ser facilmente seguido por todos (bastaria querer). Alega-se: “As pessoas se deixam levar pelas demais, o mundo já é uma bola de corrupção, portanto, entre no ritmo, ou exclua-se da sociedade.” No entanto, bastaria a cada um o mínimo de consciência social, o menor pensamento livre de egoísmo, e o mais insignificante princípio de retidão moral para que tudo isso mudasse! As consequências não deveriam importar, mas sim a atitude de dizer “basta”, de quebrar a cadeia.
Não creio que alguém possa ser totalmente desprovido de qualquer um dos valores acima citados. O que falta é a prática e a criticidade; a vergonha na cara mesmo. Contudo, ainda há remanescentes de honestidade espalhados por aí. Isso me alegra e, ao mesmo tempo, desperta um imenso e profundo sentimento de revolta e indignação contra a corrupção. Acho que os incorruptíveis deveriam se rebelar louca e friamente contra os trapaceiros. Não deixá-los ganhar mais espaço. Tirar das filas os furadores, denunciar, falar, combater. Rasgar o saco de farinha ruim para que ela possa se misturar à pouca farinha boa ainda restante e, assim, possa ser reutilizada.
Não deixemos morrer os bons princípios de moralidade. Tenhamos coragem. Já diz Oswaldo Montenegro em Metade: “Que a morte de tudo em que acredito não me tape os ouvidos e a boca”. Então vamos à luta.